Capítulo I
A criança aparece
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Esta é a história de Udyat. Quem é Udyat? Não se sabe bem se é um menino ou uma menina. Alguns olhos perceberiam Udyat sob a anatomia masculina, enquanto outros enxergariam seus traços femininos. O certo é que a grande maioria das pessoas não estava apta a perceber Udyat em sua totalidade. Ora o declaravam um menino, ora era certo se tratar de uma menina. Seu nascimento é tomado por incertezas, mas conta a lenda que Udyat teria sido filho / filha de pessoa anônima que o / a deixara na porta de um casal de meia idade e sem filhos, conhecidos pelos nomes de Noam e Rose. Sabe-se também que estes cuidaram de Udyat com muito carinho e zelo, pois acreditavam que a criança seria um presente de Deus para alegrá-los na velhice vindoura.
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A história começa mais ou menos assim… Numa manhã chuvosa de outono, Noam e Rose ouviram um barulho na porta da casa em que habitam, na cidade de Coração, que fica em algum ponto isolado da América do Sul. A princípio, Noam pensou que fosse a visita de algum passarinho buscando abrigo da chuva. Mas Rose pressentiu que não se tratava de nenhum barulho com que já estivessem familiarizados. De imediato, chamou Noam para olharem o que ocorria.
Rose abriu a porta e, para seu espanto e surpresa, viu um bebezinho dormindo docemente no tapete da entrada da casa. Noam observava, enquanto Rose se abaixava para pegar a criança na soleira da porta. Viram que ela estava envolta numa manta de fino tecido, muito delicado e suave. Era todo branco e trazia um bordado de um grande olho e letras pintadas a ouro, onde dizia: Udyat. O casal gostou da forma como o nome soava, associando-o imediatamente a criança. Dessa forma, passaram a chamá-la assim. Em seguida, Rose decide verificar sob o manto se Udyat seria referência a um nome masculino ou feminino. Uma pausa se estabelece. Rose e Noam nada dizem, nada gesticulam. Agora o silêncio tomava conta deles. A verdade é que nenhum dos dois ousou dizer ou definir o sexo do bebê. No entanto, estavam tão jubilosos e satisfeitos de sentirem o calor de Udyat em seus braços que não fazia qualquer diferença para eles se o bebezinho fosse menino ou menina. Sabiam que o essencial era dar a este pequeno ser muito amor e ensinar-lhe valores e princípios ético-morais para que pudesse crescer da forma mais honrada possível.
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CAPÍTULO II
Udyat vai para a escola
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Com o passar dos anos, Noam e Rose foram tratando logo de ensinar as primeiras letras para o filho/ a filha. Udyat aprendeu a ler e a escrever com muita facilidade. Chegaram a ministrar-lhe aulas de gramática, história, matemática. Tudo ensinado de dentro de casa mesmo, já que temiam a rejeição da criança por parte dos outros aldeãos da cidade. Porém, sabiam que haveria uma hora em que Udyat teria que colocar os pés para fora de casa, agradasse ou desagradasse aos moradores por sua forma incomum de ser.
Um dia, esgotaram-se os livros didáticos na casa da família de Udyat. Noam, então, expressa a esposa o que constata:
_Querida, é chegada a hora de apresentarmos Udyat a nossa aldeia.
Rose responde:
_Aguardava que me dissesse isso. Sim, é chegada a hora! Já faz seis anos que estamos com esta joia em casa. Mas como vamos apresentá-lo / apresentá-la?
O marido sugere:
_Vamos dizer apenas seu nome e deixamos que as pessoas tirem suas próprias conclusões.
E assim foi feito.
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No dia seguinte, o sr. Noam e a sra. Rose foram matricular Udyat na escola local e, sem mencionarem o sexo que lhe era inerente, a criança já é colocada numa classe com outras de sua idade. A partir daí, a confusão se estabelece…
Enquanto uma professora chamava Udyat por pronomes, artigos e adjetivos no feminino; outro educador, inversamente, dizia estar certo de que Udyat deveria ser tratado pelo pronome ele. As crianças da classe não se importavam com o gênero em questão e brincavam com Udyat porque sua companhia era agradável. Afinal, era o único ou a única dentre os colegas capaz de inventar ótimas brincadeiras, deixando todos felizes.
Udyat achava engraçado a forma como as pessoas o/ a tratavam. Tinha gente que dizia:
_Menino, venha aqui!
Outros concluíam:
_Que menina mais simpática!
As crianças mesclavam:
_Amigo, amiga, vamos brincar um pouco mais. Incansáveis que eram de sua companhia.
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Capítulo III
Udyat e os oradores dos templos
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Alguns anos a mais se passaram. Agora, Udyat contava com 12 anos e participava mais das tarefas rotineiras da família. Quando não tinha aula na escola, ajudava sua mãe na botica de remédios homeopáticos, pois a sra. Rose era farmacêutica. Udyat se encarregava de colocar alguns pedidos nas sacolinhas de papel. Também era comum prestar algum auxílio ao pai na tarefa de examinar animais, visto ser o sr. Noam um veterinário. A criança era vista pelos aldeãos sempre pronta a prestar ajuda a quem quer que fosse. Quando passava na porta do padeiro e o via com dificuldades com o forno, para lá se dirigia Udyat, oferecendo-lhe um pouco de barro para remendar o buraco do fogareiro. Em outras ocasiões, se acontecesse de passar perto de um faminto, não hesitava em lhe dar seu lanche escolar; ou ainda, se visse alguém doente pelo caminho, parava e fazia uma oração na mais sincera devoção para que a pessoa tivesse a saúde restabelecida. Há, inclusive, relatos de que muita gente passava a se sentir melhor depois da visita de Udyat ou após permanecerem em sua companhia. Seus pais, por exemplo, apresentavam excelente saúde e disposição continuamente.
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Naquela mesma época, surgiu na cidade de Coração uma caravana de diversas tribos religiosas e seitas das mais variadas possíveis. Montaram-se stands e palanques para a divulgação das mesmas. Tudo aconteceria na praça principal da cidade. Cada religião nomearia um orador para expor ideias e princípios que caracterizasse a essência doutrinária pertinente a seu culto, no objetivo único de arrebanhar futuros fiéis e obreiros para suas causas.
Houve assim os mais diversos discursos, carregados de eloquência e dogmatismo. Udyat e seus pais foram a essas reuniões e ouviram luteranos, católicos, evangélicos, budistas, etc. Descobriram que existem mais religiões do que acreditavam que houvesse. Descobriram também que tem gente que mata por ideologia da fé, mesmo que sua religião condene o ato de matar. Por outro lado, encontraram religiões mais inclusivas e que adotam algum tipo de sincretismo religioso. Há religiões que parecem filosofia e que contém muita história. Outras parecem ficção, mas ficção bem real. A música está presente em praticamente todas. Por isso muitas se parecem, mesmo sendo diferentes.
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Noam e Rose assistiam atentos aos debates e repararam que, por vezes, um facho de luz se acendia por entre as sobrancelhas de Udyat. Curiosa com o fato, Rose pergunta ao filho/ a filha:
_Meu amor, não entendo por que sua testa de quando em quando se ilumina.
Udyat responde:
_Mamãe, sinto uma fagulha ardente no peito e na mente toda vez que ouço algo que considero verdadeiro. São como flashes ou relâmpagos rasgando minha alma. É como se cada um desses oradores trouxesse um pouquinho de algo maior para mim. Mas não senti isso o tempo todo. Apenas as palavras que revelavam o amor incondicional que o Criador oferta a todas as suas criaturas é que me causaram tanta comoção a ponto dessa fagulha despontar de minha testa. Senti também que essa luz é para ser buscada, compartilhada e mantida, tanto de uns para com os outros como também de todos para com a vida existente aonde quer que esteja. Aliás, quando observo a natureza, não consigo deixar de sentir esse amor maior ali, impregnando cada folha, cada pétala e cada pequena ou grande criatura que surge no cenário. Isso me faz pensar que tudo o que vejo é uma pintura de amor que nos foi presenteada por Aquele que muito nos ama.
Ao ouvir tal explicação, Rose se emociona com a sensibilidade das palavras daquele ser de luz e começa a se perguntar sobre a verdadeira origem de sua filha / seu filho.
E assim a criança foi crescendo em estado de perfeita beatitude e beleza.
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Capítulo IV
O eclipse lunar
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Mais três anos se passam e agora Udyat conta com seus primaveris 15 anos. A esta altura, seu bom caráter e suas virtudes se tornavam ainda mais evidentes. No liceu, suas notas eram boas e suficientes para que deixasse o ensino médio antes mesmo de seu término. Após ter efetuado suas provas bimestrais, chegava o período do merecido recesso escolar. Coincidentemente, naquela semana haveria um eclipse lunar e a jovem / o jovem estava com uma forte intuição de que deveria observar o fenômeno. No entanto, a cidade de Coração era cercada por espessa névoa naquela época do ano que ditava o último mês do outono. Pensou que, talvez, se subisse o pico da montanha situado ao norte da cidade, poderia assistir, sem qualquer prejuízo meteorológico, ao grande espetáculo celeste. Sabia que do alto da colina havia uma cabana vazia para que andarilhos exaustos pudessem ali descansar. Então, após a observação do eclipse, pernoitaria no local e rumaria de volta para casa logo que raiasse o dia. Decidiu portanto que na hora do jantar perguntaria aos pais se poderia partir para empreender a tão pretendida jornada.
Ao anoitecer, a mesa já estava posta. Noam, Rose e Udyat se sentaram. Oraram em agradecimento por aquela refeição e, depois disso, Udyat pediu a palavra:
_Mãe, pai… Vocês estão sabendo que amanhã à noite vai ocorrer um eclipse, não?
_Sim, responde o pai.
_Gostaria muito de poder observá-lo com a luneta nova que você me deu, pai. O problema é que daqui dos arredores mal consigo ver a lua nesta época do ano. Então, pensei que talvez se subisse a montanha poderia ter uma visão mais nítida e completa do eclipse e … Bem, lá em cima tem a cabana, onde poderia dormir até o amanhecer e voltar, né? O que acham? Pergunta Udyat.
_Hoje, quando você foi procurar a luneta, senti que nos faria esta mesma pergunta, comenta o pai.
_E sim! Foi isso que seu pai combinou comigo de te responder. Sim, sim! Assegura a mãe.
_Filho/ filha, sabemos que a cabana é segura e que o local é o mais apropriado para se observar a lua. Além disso, confiamos em você – acrescenta Noam.
_ Fico feliz por confiarem em mim. Amanhã bem cedinho sairei rumo à montanha. Com folga chegarei ao topo do monte ao entardecer, a tempo para observar o fenômeno que ocorrerá no início da noite. Depois, repousarei na cabana para fazer o percurso de volta pela manhã, pondera Udyat.
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Mal amanhece o dia, Udyat sinaliza aos pais que já estava a caminho. Sua mãe entrega-lhe suprimento, água e agasalho. Enquanto isso, seu pai ia lhe ensinando umas últimas dicas para melhor utilização da luneta. E, sem mais tempo a perder, os pais se despedem de Udyat com a mesma ternura com que se despediam ao deixar o filho / a filha na escola.
A caminhada não seria demorada, porque a subida era íngreme. Fato que cansava e exaustava os andarilhos. Mas, a medida que Udyat subia a montanha, uma certa alegria lhe invadia a alma, não reparando nenhum cansaço que seu corpo pudesse sentir com o esforço realizado.
Ao atingir o cume daquele pico, alegrou-se ao perceber que não havia nenhuma nuvem no céu e, em seguida, verificou as condições da cabana, observando que o local estava vazio. Depositou seus pertences ali e encheu o seu cantil, que já estava vazio, com a água fresca da mina d’água existente ao lado da choupana. Armou a luneta e, aproveitando-se de um pequeno fogareiro existente no rústico recinto, aqueceu um prato de arroz que sua mãe lhe preparara. Comeu apressadamente, pois não tardaria muito para o fenômeno lunar se iniciar. Porém, antes que pudesse pegar sua luneta, o local é invadido por uma luz dourada.
_O que é isso? Pergunta-se Udyat para si mesmo / mesma.
A luz então toma uma forma humana e começa a conversar telepaticamente com Udyat:
_Não tenha medo! Você já me conhece, só que já se esqueceu de mim. Sou Gladyan e foi eu quem o/a deixou com o sr. Noam e a sra. Rose.
Udyat não podia dizer nada até que aquela comunicação cessasse, pois não tinha como interromper a energia telepática. A voz se dirigia com estranha clareza para dentro de sua cabeça e o/a fazia ver e entender tudo. Suas origens também estavam sendo explicadas. Gladyan era, na verdade, um ser angelical que fora encarregado de transportar Udyat do tempo futuro para o passado/presente. Fez isto porque Arimã, o senhor da escuridão, da destruição, do mal e da desordem, aprisionara seu irmão gêmeo e seu oposto, que é chamado Aura-Masda, também conhecido como o senhor da luz e do bem, para dentro de uma masmorra. Após aprisioná-lo, ainda sugou sua luz e energia, deixando-o inerte e sem condições de fuga. Agora, sem a presença da luz de Aura-Masda, a vida no futuro é repleta de maldades.
Sem entender o relato de Gladyan, Udyat se pergunta sobre o que ele/ela teria a ver com tudo aquilo. E por que esse anjo o/a retirara de um inóspito tempo futuro.
Gladyan capta as dúvidas de Udyat e esclarece mentalmente:
_Udyat, você foi retirado/ retirada daquele tempo porque ainda era um bebe, não sobreviveria naquele ambiente hostil. E como Aura-Masda havia perdido a luta para seu gêmeo maligno, muito tem se falado sobre o fim e o aniquilamento do porvir, já que o ódio lá existente está se encarregando de destruir o planeta. Seus verdadeiros pais até tentaram retirar Aura-Masda do cativeiro, mas não conseguiram. Aliás, seus pais são os próprios Noam e Rose, só que do futuro.
Nesse momento, Udyat, atordoado e espantado com a mensagem, consegue interromper as ondas comunicantes e pergunta:
_Como assim, Noam e Rose? Eles me encontraram na porta de casa!
Gladyan, ainda utilizando-se da mensagem telepática, pede paciência ao/ à jovem, prosseguindo com seu relato. De forma breve, explicou que Udyat nasceu tempos à frente da época em que vive. Noam e Rose também faziam parte do porvir. Porém, eles não se apresentavam em dois corpos distintos como agora. Ou seja, eles tinham apenas um corpo sustentado pelas polaridades masculina e feminina, como Udyat. A longa jornada deles, através de várias encarnações, transmutou a barreira da ignorância e da divisão, tornando-os almas fusionadas, isto é, o duplo em um. No entanto, ao perderem a luta para Arimã, logo após o nascimento de Udyat, as almas que haviam sido unidas num só corpo voltaram a ser divididas em polaridades distintas. O mal existente em Arimã causou uma espécie de retrogradação em seus espíritos. Daí, para que não morressem, tiveram que ser desmembrados e, em seguida, foram lançados a suas encarnações passadas, nos seus presentes corpos de Noam e Rose. Neste retrocesso, eles perderam suas memórias, não sabendo quem são de fato. O bom disso tudo é que Udyat acabou sendo criado por seus próprios pais, já que Gladyan se encarregou de levá-lo/levá-la para o passado. Estava escrito que Udyat deveria ser criado pelas energias de sua própria família para se tornar forte o suficiente para enfrentar Arimã. Por ser o único/ a única a manter as polaridades masculina e feminina em um único corpo, já que não sofrera o retrocesso da separação, como ocorrera com seus pais, isso o/a tornava a única promessa para libertar Aúra-Masda do cativeiro, salvando o futuro do planeta.
Gladyan então pergunta a Udyat, agora verbalmente:
_Você aceita lutar para salvar a luz?
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Capítulo V
A batalha
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Udyat sentiu sua testa entrar em chamas. Sabia que toda vez que aquilo acontecia era para lhe dizer que o significado de sua busca a algo, que nem sabia o que era, despontava naquele convite pouco compreensível para si mesma/ mesmo. Ainda assim, sem demora, responde:
_Eu aceito!
_Fique satisfeita/ satisfeito desse seu sim porque se vencermos esta batalha, a paz vai ser restabelecida no futuro, irradiando seus reflexos no presente e no próprio passado. Assim, até os eventos desastrosos já vividos passarão por um processo de regeneração jamais visto! -Arremata Gladyan.
Atordoado/atordoada com tanta novidade, Udyat mal percebe que estava sendo transportado/ transportada para uma outra dimensão. Quando olha a sua volta, não reconhece mais a montanha e não localiza a cabana. Nota estar num ambiente escuro e de baixa vibração. Novamente, Gladyan lhe fala sobre os acontecimentos de modo telepático.
Vou explicar o passo a passo do que você vai ver e fazer. Primeiramente, vamos descompartimentar sua natureza yin e yang. Você entrará na luta com suas polaridades separadas.
Naquele mesmo instante, Udyat é desdobrado/ desdobrada em dois corpos. Um masculino e um feminino. Ambos se olham e se reconhecem como partes de um todo. Por isso, não precisaram ser apresentados um para o outro. Sabiam de imediato quem eram e deduziam espontaneamente o que o outro/a outra sentia e pensava. Em meio a tanta compreensão, ficou acertado que o masculino partiria em ação, enquanto a parte feminina ficaria imóvel numa grande câmara de cristal blindada contra energias negativas. Deste recinto, Udyat ela guiaria Udyat ele até Aura-Masda.
Gladyan ficaria com Udyat feminina, observando-a naquele receptáculo e dando-lhe toda a assistência que precisasse. Já a polaridade masculina, começou a receber reforços de peso para o resgate de Aúra-Masda. Dentre eles, o primeiro a surgir é Mano, o guerreiro do bem. Ele chega trajado com um enorme turbante, uma calça saruel em linho branco, uma camisa larga, também branca e um colete com o desenho de um lírio amarelo. Em seguida, aparece, meio que instantaneamente, Asa. Ela é a fiel escudeira da retidão. Trazia um semblante sereno e transmitia a todos uma sensação de leveza, com seus gestos delicados, transparecendo sua conduta de fazer sempre o que é certo, porque o certo é sua fórmula única de viver. Por último, mas sem demora, chegou Logos, um ancião ainda muito vigoroso. Era conhecido por seu raciocínio afiado, repleto de bons argumentos. Ele era o único ali a possuir o dom de combater as ameaças externas sem o uso da força física. Vencia qualquer briga na base das jogadas inteligentes e do raciocínio rápido e perspicaz.
Como todos já se encontravam no local, Gladyan os apresentou a Udyat ela e a Udyat ele. Depois, desejou-lhes que mantivessem firmeza e serenidade. Chegara, enfim, a hora de Udyat masculino e seus novos companheiros partirem. Nesse momento, Udyat feminina pondera que seu trabalho na câmara de cristal exigiria dela uma plena concentração, em estado alterado de consciência ou mesmo de supraconsciência. Cabia-lhe conduzir Udyat masculino por um caminho que só ela poderia ver, pois era dela o dom da clarividência. Para realizar a tarefa, manteria contato telepático com sua metade, já que da cabine de cristal a mente do usuário tornava-se apta para transmitir pensamentos a longa distância. Quanto a Udyat masculino, restava-lhe ir, corajosamente, para a ação. Seu talento nato de agir na hora certa, além de sua valentia e bravura seriam essenciais para um possível confronto com Arimã.
Após uma breve oração, saíram do recinto Udyat masculino, Mano, Asa e Logos. Inicialmente, rumaram por uma estrada de pedras viscosas e pegajosas, semelhante a um piche negro. Este era o caminho que Udyat ele captava de sua versão feminina. Depois de alguns minutos de marcha, algumas pessoas começaram a despontar pela estradinha. Udyat e seu grupo perceberam que elas estavam contaminadas de propósitos malignos, apresentavam sempre uma aura escura e sem luz. Brigavam entre si e cometiam diversos delitos sem se importarem com isso. Mano não gostou do que viu e dirigiu-lhes algumas palavras, tentando lhes explicar que o mal que praticavam voltaria para elas mesmas, cedo ou tarde. Infelizmente, tais passantes zombaram de tudo o que lhes foi dito. Notaram mais adiante que o mal atingia também as pessoas que deveriam zelar pelas leis. Viram um servidor da fiscalização local cobrando propina para liberar obras irregulares, enquanto um outro funcionário recebia sem trabalhar. Mano, ainda tentando recuperar algumas ovelhas perdidas, explicava-lhes, amorosamente, sobre o que os esperaria caso continuassem a agir sem escrúpulos. A maioria respondeu com risadas debochadas, palavrões e impropérios. Porém, um deles se sentiu tocado com as palavras gentis de Mano. Por incrível que pareça, isso causou uma pequena diferença naquele ambiente. O ar ficou menos carregado de maldades e o caminho de piche ganhou uma coloração menos escurecida e sombria.
Continuaram a caminhada e, bem mais adiante, encontraram muitas pessoas perversas que praticavam inúmeros delitos. Um bando deles, em específico, maldizia e caluniava um grupo rival, atingindo seus componentes com mentiras escabrosas que os deixavam ainda mais à margem da sociedade local. Asa se aproximou desses embusteiros, lançando sobre suas mentes o poderoso sopro de verdade. O ar da honestidade fez com que confessassem todas as mentiras e intrigas que haviam dito a respeito de seus inimigos. Asa sabia que o efeito da verdade logo passaria e eles voltariam a mentir. No entanto, enquanto estivessem sob o efeito daquele frescor, a trilha que Udyat feminina indicava para seguirem ganhava mais luminosidade.
A caminhada transcorria de forma missionária. Isto é, Udyat e seus companheiros pareciam pescadores de homens. Apesar do véu da ilusão e da maldade pairar sobre as cabeças de muitos, alguns cidadãos puderam repensar sobre seus velhos hábitos e atitudes. Nessa marcha, depois de muito andarem e pregarem o bem, Udyat e seus amigos avistam a torre onde Aúra-Masda estava encarcerado. Percebem, contudo, que havia um grupo de cem endemoniados guardando a entrada do local. De imediato, Logos tranquiliza seus amigos, dizendo que já sabia o que fazer para distraí-los e, assim, poderia deixar a “barra limpa” para que Udyat masculino se infiltrasse para dentro da torre sem que o vissem.
O brilhante intelecto de Logos fez com que surgisse, em apenas um estalar de dedos, na parede lateral da torre, uma imensa tela de cinema. Em seguida, o astuto ancião projetou ali uma empolgante partida de futebol. Os endemoniados, não resistindo aos encantamentos do esporte, começaram a assistir avidamente ao jogo. Logos, então, persuade mentalmente para que um grupo de 50 deles passasse a torcer pelo time de camiseta vermelha, interferindo na mente dos 50 restantes a torcerem pelos que detinham o blusão negro. Os dois grupos que se formaram começaram a ficar tão eufóricos com aquela partida, berrando por um gol, xingando o juiz, reclamando por um pênalti que acabaram não percebendo quando Udyat abriu o portão, entrando facilmente na torre.
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Naquele momento, Arimã estava em seu gabinete, situado na parte alta da fortaleza. Mesmo estando distante da entrada de acesso da construção, o malfeitor que possuía uma intuição aguçada, pressentiu a torre ser invadida. Sem saber como, percebeu um ar de nobreza e de bondade soprar pelos corredores. Começou a sentir náuseas, saindo do recinto para descobrir o que acontecia ali. Astuciosamente, seguiu o ar daquela bondade e se deparou com Udyat já no calabouço para libertar Aúra-Masda. Arimã pergunta a Udyat:
_Quem é você?
Udyat responde:
_Não importa quem sou! Vim para libertar Aúra-Masda!
_Pensa que vai conseguir? E Arimã, sem aguardar a resposta de Udyat, lança-lhe o feitiço do esquecimento e da debilidade.
Udyat cai no chão e é logo colocado na cela junto a Aúra-Masda.
Arimã chama seus endemoniados, pois pressentira que seu novo prisioneiro não estava sozinho. Aos gritos, reclama pela falta de prontidão dos sentinelas e exigi-lhes que procurem pelos comparsas de Udyat. Furioso, não entende como sua fortaleza fora invadida. A maestria de Logos, acertadamente, agiu a tempo para retirar Mano e Asa dali. Assim, todos conseguiram fugir para fora da linha dimensional da torre, longe de qualquer perigo.
Aúra-Masda, o bom guerreiro, estava trancafiado ali há anos. Com o passar do tempo, foi ficando cada vez mais fraco. Por isso, não tinha energia para acordar Udyat. Afinal, Arimã havia sugado seus poderes de longa data. Sabia, no entanto, que se Udyat continuasse inconsciente por mais algum tempo, esquecer-se-ia de sua verdadeira natureza e encerraria seus dias no véu do mais absoluto esquecimento.
Por sorte, Udyat feminina estava ainda na câmara de cristal e mantinha-se ciente do que ocorria com sua metade masculina. Gladyan que estava lhe dando suporte naquela cabine sabia o que fazer. Precisaria, contudo, de toda a ajuda e esforço de Udyat feminina. Disse-lhe, telepaticamente, que primeiro era preciso que ela enviasse uma vibração de calma para a sua parte masculina. O que foi realizado com sucesso. Depois, transmitiu-lhe a informação de que era necessário que ela entrasse no sonho de Udyat masculino, despertando-o do véu do esquecimento. Seria a única saída para que ele acordasse a tempo de se salvar e libertar Aúra-Masda.
A metade feminina chegou a transe profundo, a ponto de entrar imediatamente no sonho de Udyat ele. Houve uma fusão anímica entre eles e a testa de Udyat masculino começou a arder e a se iluminar. Todo o seu espírito se abrasou, fazendo a versão masculina despertar daqueles feitiços. Aos poucos, Udyat ele foi voltando a si, percebendo tanto a presença espiritual da chama feminina quanto da presença física de Aúra-Masda, bem a seu lado na cela. Em seguida, a versão masculina, já em perfeitas condições, mentalizou a porta do recinto se abrindo. E tudo transcorria exatamente da maneira como pensava.
Aúra-Masda, bem debilitado, não conseguia articular palavras, mas caminhou de forma lenta até Udyat, fazendo-o entender que o único meio de saírem dali seria se o jovem pudesse mentalizar a transferência do poder que Arimã lhe roubou de volta para ele.
Udyat, imediatamente, começou a realizar aquela a tarefa. Sentiu que sua chama feminina estava ainda sutilmente com ele. Daí, cerrou seus olhos e começou a visualizar uma poderosa energia saindo do espírito de Arimã para ser transposta de volta a Aúra-Masda. Aos pouquinhos, o bondoso guerreiro foi ganhando de volta sua força e sua plenitude energética. Todos os seus merecidos poderes de grande mestre já não estavam mais com Arimã. Refeito com todo seu vigor e muito bem disposto, Aúra-Masda finalmente consegue estabelecer um diálogo com Udyat:
_Obrigado por me salvar, meu jovem. Eu sei quem é você. E já esperava que viesse até aqui. Mas agora cabe somente a mim lutar contra meu irmão maligno. Na primeira luta que travamos não consegui vencê-lo, porque senti pena dele. Mas agora é questão de justiça restabelecer a ordem. O futuro do planeta está mais uma vez nas minhas mãos. Dessa vez, não vou me apiedar desse vil irmão!
_Foi um prazer ajudá-lo, mestre. Sei que desta vez vencerá seu maligno irmão, intui Udyat.
Os dois se apressam para saírem dali e rumam para o alto da torre. Na medida que avançam, vão se deparando com alguns sentinelas do mal. Udyat, já hábil em seus poderes, usa sua imaginação para imobilizá-los. E, assim, o caminho vai ficando livre até cruzarem com Arimã que os aguardava lá do alto, dizendo-lhes ironicamente:
_Ah! Irmãozinho, vejo que recuperou seus poderes. Oh! Subestimei este pirralho que veio salvá-lo. Que contratempo me sucedeu hoje, hein?
_Sim, mas agora vamos resolver nossa pendência, não é? Essa luta será justa, porque não vou lutar com o sentimento de clemência por ti, mas sim com o senso da justiça que é devida a todos! Prepare-se, Arimã, afirma Aúra-Masda.
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Neste instante, uma guerra mental é travada. Ninguém se movia. Aúra-Masda e Arimã com olhos fechados guerreavam em pensamentos. Enquanto o bom guerreiro sintonizava e entronizava pensamentos de amor, perdão, justiça, bondade… Arimã pensava no ódio, no egoísmo, na inveja… . Enfim, essa guerra mental deveria durar o suficiente para que um ou outro sofresse um desgaste energético e mental. Os pensamentos de amor por toda a criação que Aúra-Masda emanava foram tão fortes que fizeram Arimã cair no solo, sem forças para pensar em mais nada.
O corpo e o espírito trevoso de Arimã foram para uma dimensão que comportasse seu desajuste. Já Aúra-Masda e Udyat, automaticamente, integram-se na dimensão do bem, agora totalmente restaurada.
Depois disso, todos se reencontram jubilosos: Mano, Asa, Logos, Gladyan, Udyat ele e Udyat ela comemoram a vitória. Aúra-Masda inicia seu novo reinado deletando todas as maldades implantadas por Arimã. Udyat masculino novamente se une a Udyat ela. As polaridades ela e ele agora não mais se separariam. O reinado de Aúra-Masda já se tornava o reino celestial.
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Epílogo
A volta para casa
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Restaurada a luz, Gladyan viaja de volta no tempo com Udyat. Chegam ao alto da montanha da cidade de Coração. O tempo por ali pouco, ou quase nada, transcorrera. A única diferença é que o ar da montanha estava mais puro e leve. O eclipse já havia ocorrido, voltando a lua a ser iluminada pela luz.
Gladyan leva Udyat de volta para a casa de Noam e Rose. Com o teletransporte oferecido por esse mensageiro do futuro, Udyat não precisaria mais pernoitar na cabana. Bastou pegar seus pertences e lá estavam eles, bem na porta da casa de Udyat.
Noam e Rose ouvem o barulho e surpresos, o pai pergunta:
_Filho/ filha, você não dormiria na montanha?
_Não precisei, diz Udyat. E o jovem/ a jovem conta toda a história para os pais.
Sua mãe bastante pensativa pergunta:
_Meu amor, você vai nos deixar para viver nesse outro mundo?
Udyat responde:
_Eu jamais os deixaria, pois estou sempre conectado/ conectada a vocês.
Gladyan, então, revela a Noam e a Rose que eles já viveram no futuro como os pais verdadeiros de Udyat. Disse-lhes também que, em tempo oportuno, entenderão tudo o que aconteceu com eles, já que agora não sofrem mais as interferências das trevas. Como Aúra-Masda venceu Arimã na batalha mental, o campo vibratório deles poderia novamente voltar ao estado de fusão. Mas, para que isso aconteça, eles deverão passar por um longo caminho de novos aprendizados. No momento, o bom é viver cada dia de forma íntegra e sempre com muita alegria. Por falar em alegria, a espessa névoa que castigava a cidade de Coração não mais esconde o local. As noites agora são mais estreladas e os dias mais luminosos.
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Com um sorriso, Gladyan se despede de Udyat e de seus pais. Assegurou-lhes que a paz e a harmonia estariam presentes em seu lar. Finalizou dizendo que, talvez, uma nova aventura chegasse para que a fusão entre Noam e Rose pudesse acontecer.
Udyat abraça seus pais e todos se despedem de Gladyan.
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Aviso aos leitores: O tempo verbal do enredo oscila entre presente, passado e futuro com o propósito de desconstruir a linearidade temporal. Em uma mesma frase, esta desconstrução pode ser visível, já que os personagens não conseguem se estabelecer apenas no momento presente, como a maioria dos seres humanos. Então, será que o tempo existe em Udyat?
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Fim.
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